11 março 2014

O que sabemos sobre as universidades?

Nestes tempos de austeridade em que as funções sociais do Estado vão sendo desmanteladas, é muito comum a intervenção política e cívica ser praticamente ocupada por posições defensivas. Ao contrário de outros tempos em que as perspetivas críticas e emancipatórias colocavam no debate público, por exemplo, os problemas da pedagogia e da emancipação nas escolas, hoje a intervenção social e política na educação concentra-se muito mais na resistência aos ataques que têm sido feitos à escola pública.

Sempre achei que precisamos das duas perspetivas: a crítica à escola pública é condição da sua defesa; e a defesa da escola pública é parte da luta por uma escola democrática que precisamos de aprofundar. Contudo, a perspetiva que aqui trago é totalmente defensiva: apesar das universidades na europa estarem longe de serem perfeitas, o ataque que sobre elas se tem desenvolvido merece que se acentue o papel que elas têm tido no desenvolvimento das sociedades.

Um relatório com poucos meses da London School of Economics and Policial Science sobre o papel do Ensino Superior no desenvolvimento das sociedades mostra, através de um resumo da principal literatura científica publicada desde 2003, que objetivamente são imensos os contributos da formação no Ensino Superior para o desenvolvimento social, cultural e económico. A síntese dos estudos realizados e das suas conclusões são impressionantes.
Os vários estudos citados procuram comparar, para população com formação superior e com menos formação, se há diferenças em termos de práticas (por exemplo taxas de voto, práticas de saúde, participação cívica, crime, violência etc.) e de representações (tolerância face à imigração e à diversidade cultural, valorização da participação cívica, rejeição da violência etc.). E de facto, embora a relação nunca seja mecânica, há uma forte correlação entre a formação superior e as práticas e representações mais democráticas e que mais contribuem para o desenvolvimento social, económico e cultural das sociedades em que vivemos.

Com efeito, cada um dos assuntos e dos estudos mereceria uma discussão própria. Mas entre outras conclusões, a literatura científica produzida desde 2003 mostra uma relação clara entre a formação superior e os melhores indicadores em termos de cidadania, saúde, bem-estar, crime e desenvolvimento económico.

Entre outras coisas, no que respeita à cidadania, identifica-se um aumento das taxas de voto, da participação cívica e política entre os diplomados, bem como maiores expectativas sobre a forma como a participação pode efetivamente transformar a realidade. Para além disso, identifica-se também que os diplomados são tendencialmente mais tolerantes à imigração, à multiculturalidade e que rejeitam mais a violência. No caso da saúde, os estudos mostram uma relação direta entre a formação superior e menores riscos de obesidade, a melhor alimentação e a melhores práticas de saúde e de bem-estar. No que respeita à violência e ao crime as percentagens de diplomados que praticaram crimes ou se envolveram em situações de violência é tendencialmente menor quando comparada com quem tem menos formação e identificam-se estudos que concluem que o estímulo à formação superior em contextos sociais de violência contribuiu para uma redução do crime, associado a uma redução da pobreza e das desigualdades sociais. E no campo da economia o aumento da qualificação traduz-se, entre outras coisas, no desenvolvimento científico e tecnológico, em trajetórias de mobilidade social, em menores riscos de desemprego, em melhores salários e contribui para a transferência de conhecimento para a sociedade, para o desenvolvimento sustentável das cidades e para a revitalização de zonas empobrecidas e com perda de população.

É certo que as universidades não são, em nenhuma medida, universais a todas as classes e grupos sociais. É certo que elas também são profundamente conservadoras em muitos domínios. E é certo que nelas se têm infiltrado os piores discursos sobre a mercantilização da sociedade. Mas no momento em que se assiste a um ataque quase sem precedentes à universidade pública, vale a pena destacar também isto: se não fosse o desenvolvimento do ensino superior público as nossas sociedade seriam muito menos democráticas, plurais e desenvolvidas. Por isso, proteger as universidades deste ataque deve ser uma missão coletiva. Porque não vai haver melhores universidades, se continuarmos a deixar que destruam as que existem.

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