Saiu há poucos dias o mais recente relatório do Eurydice, uma rede europeia que recolhe e sistematiza dados sobre o ensino superior e as políticas educativas na Europa. É um relatório extenso centrado em quatro dimensões da modernização do
ensino superior: o acesso ao sistema; a retenção; a flexibilidade na gestão do
estudo; e a empregabilidade e inserção profissional dos diplomados. São mais de
90 páginas que comparam vários aspetos destas quatro dimensões. De uma primeira
leitura vale a pena destacar alguns dados interessantes.
Em primeiro
lugar, relativamente ao acesso ao sistema, identifica-se que há uma grande diferença
nos inquéritos de monitorização dos inscritos no ensino superior europeu, sendo
que em dezanove países, as agências de qualidade não foram capazes de analisar
a evolução do número de estudantes nos últimos 10 anos. A maioria dos sistemas
não diferencia os alunos inscritos, por exemplo, por origem nacional, etnia ou
condição socioeconómica. E sobre os sistemas de acesso alternativos aos concursos
“normais”, não se conhecem dados sobre quem são os estudantes abrangidos.
Em segundo
lugar, no que respeita à retenção dos estudantes, os indicadores usados nos
vários sistemas são muito diferentes, impossibilitando uma leitura rigorosa e
comparada, sendo que os dados que existem raramente são utilizados para avaliar
as instituições. Os dados da retenção dos estudantes quase nunca estão
discriminados pelos perfis sociais dos alunos e o relatório identifica também que
há pouca evidência de que os dados sobre o insucesso e o abandono escolar sirvam para criar
estratégicas de resolução das causas do fenómeno.
Em terceiro
lugar, no que respeita à flexibilidade, apresenta-se um dado curioso. É o de
que os programas a tempo parcial – tantas vezes proclamados como formas de
alargar o acesso aos estudantes mais pobres, que podem assim trabalhar e estudar
em simultâneo -, têm cada vez mais estado articulados com lógicas de
financiamento privado ao sistema. Normalmente empresas que pagam aos seus
funcionários para formações específicas. A flexibilidade não está apenas, como
se foi dizendo, dependente de uma lógica de alargamento do ensino superior às
classes menos favorecidas, mas faz parte também de uma estratégia empresarial das
universidades.
Em quarto e
último lugar, a empregabilidade é usada para fins muito diversos no ensino
superior europeu. Serve desde para calcular o desemprego e as trajetórias
profissionais, até para promover adaptações curriculares dos cursos no sentido
de lhes dar maiores “competências de empregabilidade”. Em vários países o “desempenho
de empregabilidade” garante ou restringe verbas de financiamento. E por fim,
não se conhecem estudos sistemáticos sobre a relação entre a inserção e
trajetória profissional dos diplomados e as suas condições sociais e económicas
de origem ou de pertença.
Conclusão preliminar:
caminhamos desde 1998 para um “modelo europeu unificado de ensino superior”, mas
passados 16 anos ainda nem existem dados comparáveis e rigorosos sobre os principais
aspetos desse sistema. E normalmente sem dados sérios, não há políticas
públicas sérias que resistam.
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