04 julho 2014

Big Brother is still watching you


Há notícias que nos chegam e se perdem na espuma dos dias e na nebulosa informativa que nos atinge diariamente nas redes sociais. Mas há notícias que importa não esquecer e sobretudo que importa inscrever nos debates do nosso tempo. Esta semana tivemos uma dessas notícias: Edward Snowden divulgou mais um documento secreto onde se lê que a NSA estava autorizada a vigiar 193 países do mundo. De fora ficaram apenas o Reino Unido, o Canadá, a Austrália e a Nova Zelândia que têm um acordo de não-espionagem com os EUA, o Five Eyes.

O documento divulgado mostra que os EUA podiam intercetar comunicações e vigiar cidadãos e governos de todos os países do mundo. A justificação é simples: todos são potencialmente suspeitos de pôr em causa a segurança nacional americana e por isso todos devem ser permanentemente vigiados.

O que surpreende neste documento não é apenas a arbitrariedade dos sistemas de vigilância e espionagem. A esse respeito a história de Guantanamo mostra bem como no “mundo desenvolvido” pode haver um sistema de justiça medieval, sem que isso cause especiais remorsos à comunidade internacional. O que parece ser novo é que há, de facto, uma cobertura legal para a arbitrariedade. A autorização de vigilância para todo o mundo foi dada pelo Foreign Intelligence Surveillance Court e, nestes dias, a Privacyand Civil Liberties Oversight Board (PCLOB) divulgou um relatório dizendo que a vigilância americana é “razoável”, é “legal e eficaz para a segurança interna” e está enquadrada constitucionalmente. Ao mesmo tempo, antigos funcionários governamentais diziam ao Washington Post que o sistema é adequado uma vez que os EUA precisam de garantir a evacuação dos seus cidadãos em caso de catástrofes humanitárias. Já vi, apesar de tudo, argumentos mais consistentes.

Podia-se esperar que a ONU tivesse um papel neste processo. Será razoável para os governos do mundo que haja uma superpotência que atribui a si mesma o direito de vigilância e espionagem sobre todas as partes do mundo? Razoável não é e isso viu-se na deliberação de Dezembro de 2013 da ONU. A proposta de Merkel e Dilma sobre os direitos de privacidade na era digital foi aprovada por unanimidade. Mas será que isso nos salva de um Big Brother permanente sobre as vidas dos povos e dos Estados? É claro que não: a deliberação nem sequer era vinculativa.

As notícias de Snowden dão-nos conta do estranho mundo em que vivemos. E o futuro não parece ser radiante. Pelo contrário. Parecemos estar a voltar para uma justiça medieval, arbitrária e sem controlo, cujo sistema de vigilância já esteve mais longe do 1984

1 comentário:

  1. Nesse caso, recomendo que em todos os posts, comentários, emails, mensagens nos facebooks, etc., (e completamente a despropósito), toda a gente introduza palavras como terrorista, bombas, antrax, sunitas, xiitas, jihadistas, ETA, al-qaeda, etc.

    Ao fim de duas semanas a NSA ficará completamente entupida…

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