29 janeiro 2015

A política do possível, ou… Como bocejar com polido realismo?

Queria contar-vos, no espaço de algumas linhas, a história da política do possível. 

Ao contrário de outras histórias, efabulatórias e perigosamente imaginativas, a história da política do possível não começa com “era uma vez…”. Na verdade, ela é tão bolorenta e tão repetitiva que é preciso poupar nos intróitos, não vá congelar os ouvintes e o próprio narrador numa espécie de inanição mortífera. Vamos directos e ligeiros, que o tempo urge e as palavras custam.

A política do possível é um esmifrado encolher de ombros que, em vez de se reduzir à insignificância que a define em si mesma, se revela fundamental para manter a ordem das coisas. Ela é presente e passada (só não é futura porque não queremos poluir o possível com incertezas temporais). Três características fundamentais resumem a política do possível:


1.       A política do possível é velha como o mundo. A sua provecta idade talvez justifique a tendência para sustentar os desígnios mais conservadores, mais arrumadinhos e mais sensatamente prendados. Ela não faz história, mas alimenta o presente histórico para não deixar que nada aconteça.

2.       A política do possível é mais possível do que política. Aliás, em bom rigor ela até é apolítica. Por isso é prática e maneirinha. Foi ela que ditou a aceitação encolhida da austeridade e tem sido ela que tem mantido uma Europa gerida e governada a folha de cálculo, dando uso exclusivo da máquina de calcular ao mesmo conjunto de donos/as. A política, no proceder exclusivo de um guardião do possível, é uma chatice institucional gerida a tempos mortos.

3.       A política do possível é birrenta. Vocifera frequentemente contra “contos de criança”, contra quimeras nebulosas e contra o próprio espírito do Contra. Ela é liminarmente contra o Contra. Por isso mesmo (e como – com – dá +), a política do possível está sempre pronta a dizer que sim a tudo e a firmar os pés no terreno concreto da aceitação. E é por isso que se revela tão volúvel, sujeita como está à circunstância e à conveniência das possibilidades. Ela é um bocejo, na sua candidez pragmática. Ela é um deserto de ideias e uma repetição de acções, andando pelo espaço público como quem conta carneirinhos. 

Muito haveria a dizer sobre a política do possível e sobre o seu poder soporífero, mas vai longo o post e convém não maçar almas leitoras para lá das possibilidades. Resta sublinhar que foi esta política do possível, a velha e presente política do possível, que sofreu um rude golpe com os ventos vindos da Grécia. Esta atitude adormecida, este bocejo do possível, tombou um pouco com os votos do povo grego, que ousou agir no avesso do possível e nas costas do apolitismo maçador do ajanotado aparelhismo europeu. 

E é por isso que, na Grécia, ninguém está com vontade de dormir.

É despertar, Europa!

z

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