28 fevereiro 2014

Muito cuidado com os decretos...



O João Teixeira Lopes citava aqui os paradoxos que persistem em Portugal em matérias de desenvolvimento do sistema educativo e de persistência de desigualdades escolares consideráveis e duradouras. Esse paradoxo é particularmente acentuado nas políticas que hoje se desenvolvem para o Ensino Superior. Queria-vos falar especificamente do que o governo está empenhado em transformar na rede de ensino superior, particularmente através dos decretos orientadores para a fixação vagas, onde as instituições encontram os critérios gerais que devem presidir ao número de cursos e vagas que podem abrir no ano letivo seguinte. 

Encontramos uma novidade nos decretos dos últimos dois anos lectivos que fixaram as vagas para 2012/2013 e 2013/14. Neles são incluídas duas questões absolutamente claras: em primeiro lugar, as vagas no ensino superior devem ser condicionadas mediante o desemprego e a “empregabilidade” dos diplomados; em segundo lugar, ajustar as vagas em função dos critérios de empregabilidade passa a ser uma obrigação no quadro da racionalização da rede de ensino superior.

27 fevereiro 2014

Desigualdades

Neste artigo (aqui) percebemos bem uma das singularidades mais fortes da sociedade portuguesa contemporânea: apesar da possibilidade de mudança social e dos progressos das políticas públicas (a escolaridade dos jovens com 21 anos triplica a dos pais), mantém-se a divergência face à média da união europeia (7-8 anos de escolaridade média em Portugal face a 11-12 na União europeia) e, principalmente, o peso explicativo das pertenças de classe: mais reprovações nos jovens com pais pouco escolarizados e/ou operários ou trabalhadores não qualificados; discriminação precoce das raparigas no mercado de trabalho.

Energia poluente pintada de verde – Os agrocombustíveis



Como todas as economias avançadas, a União Europeia depende da importação de petróleo para o funcionamento do seu sistema de transportes, largamente baseado no transporte individual. Para reduzir a dependência face ao petróleo, a Diretiva de Energias Renováveis determina que, até 2020, 10% das necessidades energéticas no setor de transportes deverão ser satisfeitas com fontes renováveis. Na prática, isto traduz-se em usar cada vez mais combustíveis produzidos a partir de matéria vegetal, retirando comida do prato dos mais pobres do planeta para encher os depósitos dos automóveis nos países industrializados.

Expandir a produção de agrocombustíveis implica converter áreas crescentes de cultivo em países do Sul à produção de açúcar, palma ou outras matérias primas, reduzindo a área destinada ao cultivo de bens alimentares. Consequentemente, o preço dos bens alimentares aumenta, agravando a fome no mundo. Como as pessoas continuam a precisar de comer, novas áreas de cultivo de alimentos surgem onde antes estavam florestas, savanas ou zonas húmidas, destruindo ecossistemas ricos e agravando a crise climática que os agrocombustíveis supostamente aliviariam. As alterações no uso dos solos, diretas e indiretas, provadas pelos agrocombustíveis, são suficientes para que a sua contribuição para as alterações climáticas seja superior à do petróleo, quando considerado todo o ciclo de produção.1

24 fevereiro 2014

Uma nota sobre a história das ideias: quem é que se esqueceu de pagar o almoço?

A lenda é esta: Vilfredo Pareto (1848-1923) argumentava, numa conferência académica, que a economia se rege por "leis naturais", mecanismos implacáveis que determinam e descrevem os comportamentos das pessoas e grupos e entrou em conflito com Schmoller sobre o assunto. (Ao lado, Pareto e Schmoller)

Pareto era o sucessor de Léon Walras na sua cadeira de economia política na Universidade de Lausanne, na Suíça, mas isso não queria dizer muito nesse momento: as teorias de Walras e de Pareto só mais tarde se tornaram canónicas na economia. Talvez isso explicasse a descontração da crítica e das interrupções que um consagrado professor de economia foi gritando a partir da audiência: "não existem leis naturais na economia", dizia Gustav von Schmoller (1838-1917). Schmoller, da Universidade de Berna, era então um dos economistas mais famosos, e certamente o economista alemão mais influente.