13 fevereiro 2014

Acabaram-se as mobilizações? Notas sobre avenidas e vielas




O retorno da «rua» como fronteira.

A 25 de setembro de 2011, dia de manifestação contra as medidas de austeridade em Madrid, uma imagem marca o dia: Alberto Casillas Asenjo, o empregado de mesa de um restaurante situado nas imediações da Praça Neptuno (sede do Congresso Nacional) impede a entrada da polícia de choque no estabelecimento onde se refugiam dezenas de manifestantes em fuga. A manifestação convocada pela coordinadora 25s – plataforma que agrupa dezenas de coletivos formados pelos movimentos das acampadas e assembleias populares existentes desde a manifestação inaugural de 15 de Maio de 2011 – tinha como mote o rodeo al Congresso, cerco ao Congresso Nacional, e avançava no seu manifesto[1] com a necessidade de resgatar a democracia perante o sequestro da soberania popular pelos mercados e pela troika. O cerco não chegou a ter lugar perante a musculada intervenção policial e um pequeno grupo dos milhares de manifestantes, que fugiam à carga, encontrou abrigo no espaço guardado por Alberto Asenjo. A imagem forte, e em certa medida romântica, protagonizada por este empregado de mesa é o nosso ponto de partida para a análise de uma fronteira que retorna à cena política europeia: a rua.

12 fevereiro 2014

Legalização da canábis: o Colorado marca o ponto de viragem?


Os EUA impulsionaram o proibicionismo global no século XX e ainda hoje se batem nas Nações Unidas por mais repressão e menos tolerância para os consumidores de drogas. Ironia da história: entre os primeiros a vencer o proibicionismo estão os cidadãos norte-americanos do Colorado, onde a venda de canábis para uso recreativo é legal desde o início do ano.

Este texto resume as mudanças trazidas pela legalização, o impacto previsto nas receitas fiscais e no apetite da finança pelo mercado da canábis nos EUA, as implicações eleitorais do crescente apoio à legalização revelado nas sondagens nacionais e, por fim, as contradições que ela levanta no debate internacional sobre política de drogas a dois anos de distância da próxima conferência da ONU.

11 fevereiro 2014

Trabalho de menino é pouco?

Na semana passada, a imprensa internacional fez eco da publicação do Relatório The State of the World’s Children 2014. Este relatório, publicado anualmente pela UNICEF, é um instrumento fundamental para compreender alguns dos mais importantes indicadores sobre a infância. A imprensa portuguesa, num caso como noutro, apresenta apenas os dados referentes aos “países lusófonos”. Sendo o trabalho infantil uma das dimensões mais significativas do Relatório, apesar de algumas assimetrias na recolha dos dados [1], a compreensão das várias dimensões apresentadas não dispensa uma análise mais ampla do ponto de vista geográfico, assim como o cruzamento dos dados com outros indicadores.

Esta é a primeira conclusão: é evidente a existência de zonas geográficas de concentração extrema do trabalho infantil. Neste caso, como em tantos outros, a histórica relação Norte/Sul teima em impor-se como referencial de uma divisão social e económica do mundo. Assim, verificamos que as maiores taxas de trabalho infantil se concentram sobretudo em três regiões do continente africano: África Subsariana (27%), África Oriental e do Sul (27%) e África Ocidental e Central (26%). Da mesma forma, não será estranho que dos 37 países que registam uma taxa de trabalho infantil superior a 20%, apenas sete não se situem no continente africano [2]. De resto, todos estes valores são significativamente superiores à média mundial (15%), sendo esta superada em mais de 300% pelo país com a maior taxa de trabalho infantil, a Somália (49%). Nenhum país do continente europeu apresenta um valor superior a 20%, estando Portugal situado no primeiro quartil (com uma taxa de 3%).

Precariedade: a nova batalha de quem trabalha


Um conceito de combate

André Gorz lançara já o alerta, a produção ideológica acompanha sempre o passo rápido das transformações produtivas. No campo do poder, a conhecida missiva social-democrata construída em oposição à tese da emancipação pelo trabalho «não importa o trabalho que faças, desde que sejas pago no final», transmutou-se em justificativa austeritária «não importa quanto ganhas, desde que tenhas um emprego»1. Esta apresentação do trabalho como bem raro, alvo de disputa e contenda social, não se opera pela deslocação da sua centralidade na estruturação das relações sociais, pelo contrário, a mensagem reforça a relação salarial como fim único para a reprodução do indivíduo – quem perde o emprego, perde tudo. O desdobramento deste pensamento é conhecido, perante a destruição acelerada da economia e a calamidade do desemprego, os limites diluem-se, quem trabalha deve estar disposto a aceitar todas as mudanças, todos os vexames. Uma dimensão de subordinação que pode ser encontrada na própria etimologia da palavra “precário”: precarius, aquele que pede ou obtém em oração. A súplica do emprego como súmula grotesca da era da austeridade.

10 fevereiro 2014

O referendo na Suíça é um sinal. É um sinal de quê?


O resultado do referendo para a limitação da imigração na Suíça alertou a Europa para a ameaça xenófoba. A extrema-direita rejubilou e a esquerda assustou-se. Ora, só parece estranho que a reação seja tão tardia, tão desorganizada e tão frágil. Nos Estados Unidos como na Europa, têm sido frequentemente os mais moderados quem tem tomado a dianteira nas ameaças aos imigrantes, por puro cálculo eleitoral. O sinal suíço é somente o primeiro sintoma da profundíssima doença europeia.

09 fevereiro 2014

Percepção vs. Realidade: Desigualdade na América


A desigualdade na distribuição da riqueza nos Estados Unidos da América é bem pior do que a percepção dessa desigualdade.