Os jornais dizem que o Banco de Portugal (BdP) diz que
são necessários mais 7000 mil milhões de austeridade. O governo mantém que não
é bem assim, tal e coiso, depende. Por via das dúvidas, fui ler o tão falado
Boletim, que agora vos entrego em resumo.
1. Algumas notas de pré-leitura
O que o BdP faz
neste estudo, chamado de “políticas invariantes”, é calcular a evolução do
défice e da dívida caso nada se alterasse na economia portuguesa. Como todos os
exercícios deste tipo, a análise peca pelo irrealismo de algumas hipóteses.
Nomeadamente aquela que estabelece
que o cenário macroeconómico se mantém inalterado, independentemente das opções
orçamentais que forem tomadas. Isto quer dizer o quê? Quer dizer que pode
correr muito pior que o previsto.
O saldo orçamental considerado é sempre o
estrutural, aquele que consta do Tratado Orçamental. Sem entrar em outros
pormenores, é a medida que pretende retirar os efeitos dos ciclos económicos do
cálculo do saldo orçamental (mais informações sobre isto aqui).
Em 2014, esse saldo estrutural será de -2,6%. O objetivo determinado pelas regras europeias é que seja de -0,5%.
2. Entre 2014-2019, o que esperar?
O BdP assume que o país cresce a uma taxa média de 3,4% ao ano (PIB); que a taxa média de juro a pagar pela dívida pública aumenta para 4,2% até 2019, e que não há quaisquer outras alterações no cenário económico (no desemprego, por exemplo).
O BdP não inclui as últimas medidas de austeridade para 2015 que vinham no DEO (0,8% PIB) e assume que, tal como prometido, os cortes salariais e a CES (pensões) serão progressivamente devolvidos até 2019.
O raciocínio é: partindo de um défice em 2014 de 2,6%, se acrescentarmos o aumento da despesa com juros da dívida pública (0,8%), um fator de ajustamento do modelo (0,4%), a devolução dos salários (0,7%) e das pensões (0,4%), chegaremos a 2019 com um défice de 4,9%, muito longe do objetivo de 0,5%, e com uma dívida de 132,2%, também muito acima do objetivo.
Se nada for feito, e o governo devolver os salários e pensões como prometeu, o défice será 7700 milhões de euros acima do acordado com Bruxelas. E é aqui que entra a nova austeridade, que terá de ser 4% do PIB para que, combinada com um efeito de redução da despesa em juros (com o défice desce, o BdP assume que se paga menos em juros), permitirá atingir o objectivo de 0,5%. A dívida, por seu turno, descerá para 121,5%.