28 fevereiro 2015

O CDS acabou?


A certeza de que a direita portuguesa se apresentará coligada nas próximas eleições impõe a pergunta. Há espaço para o CDS na cena política portuguesa ou o regime que germina destes cinco anos de austeridade ditou a unificação da direita portuguesa?

A última vez que PSD e CDS formaram uma coligação pré-eleitoral para as legislativas foi em 1980. Um outro país, no qual Sá Carneiro pressentia a necessidade histórica de reunificação das direitas enfraquecidas pelo abanão do PREC. A revisão constitucional de 1982, que preparou o terreno institucional para a nova via europeia, antecipando as leis fundamentais no domínio da propriedade e controlo do Estado, justificava a sintonia política. Durou o necessário.

Daí ao CDS que hoje conhecemos, assente no domínio omnipresente do líder, foi uma vida. Nos anos noventa, o partido do taxi, esmagado à direita pela hegemonia cavaquista, não respondia aos apelos mais refinados de uma "nova direita", acalentada por Paulo Portas nesta entrevista recuperada há pouco tempo.


A luta contra a direita neoconservadora tradicional, encarnada pela figura notarial de Cavaco, passava pelo resgate do CDS a partir de uma afirmação cultural distintamente classista, muito suportada pela pena de Miguel Esteves Cardoso, e por uma difusa mimetização discursiva do conservadorismo inglês, assente no elogio das instituições perenes e do empoderamento das elites. Com o início do reinado de Portas, toda esta retórica estancou perante a impossibilidade da sua tradução em votos. A direita cool e moderna, mesmo com o suporte de alguns democratas-cristãos, precisava encontrar o seu campo eleitoral, e o PSD ainda era o partido central da burguesia portuguesa.

27 fevereiro 2015

SYRIZA e estratégia socialista

Stathis Kouvelakis, membro do Comité Central do SYRIZA, é m dos críticos mais fortes do governo liderado por Tsipras, com várias notas publicadas nas redes sociais e uma série de artigos na Jacobin, O debate organizado pela International Socialism tem apenas dois problemas: a primeira intervenção, paupérrima e tristonha, de Alex Callinicos, e a falta de questões que obrigassem Kouvelakis a explicitar melhor os termos da sua intervenção. 

Mas a intervenção é, por si, valiosa: mostra que, em bom rigor, nenhum partido da esquerda radical portuguesa parece ter capacidade para contestar os termos da cultura política dominante e avançar uma estratégia que reconheça a necessidade de reconhecer o Estado como terreno enviesado e instável, a não-sacralidade do movimentismo (é uma condição necessária, mas não suficiente para uma qualquer transformação social) e a prioridade de inventar formas organizacionais que definam as suas estratégias no sentido de tornar os focos de luta dentro e fora do Estado complementares e mutuamente constitutivos. 

Não é que o SYRIZA seja necessariamente a condensação de um processo de recomposição da esquerda radical grega - isso pode ser contestado e imagina-se que o KKE e a ANTARSYA tenham as suas reservas. Mas parece ser importante reflectir sobre o que está a suceder na Grécia para além de ideias pouco produtivas como capitulação, retirada ou inutilidade.



26 fevereiro 2015

O melhor CEO da Europa vai ao tapete



25 fevereiro 2015

E se te oferecessem 1000 euros em troca de um despedimento na empresa?



Depois das Palmas de Ouro com "Rosetta" (1999) e "A criança" (2005), Luc Dardenne e Jean-Pierre Dardenne voltaram em 2014 a Cannes como uma indicação para este "Dois dias, uma noite" (2014). O objeto é imensamente atual e trata o caso de Sandra, uma trabalhadora brilhantemente interpretada pela francesa Marion Cotillard, que depois de uma depressão está na eminência de ser despedida. O dono da empresa propôs aos trabalhadores que votassem entre receberem todos um prémio salarial de 1000 euros ou manterem o posto de trabalho de Sandra. 

Confrontada com uma primeira votação arrasadora na sexta-feira, Sandra é ajudada por uma companheira a ir falar com o patrão para que a votação pudesse ser repetida na segunda-feira. O patrão acede e Sandra tem apenas um fim-de-semana, dois dias e uma noite, para convencer os trabalhadores da sua empresa a apoiarem a sua permanência no local de trabalho, mesmo que para isso tenham que abdicar do prémio de mil euros prometido pelo patrão. 


O que choca neste filme não é só a dureza da situação retratada. A crueldade, a expressão e a carga emocional de uma mulher que corre um a um, todos os seus colegas, a implorar que estes votem pela sua permanência na fábrica. O que choca também é que no retrato dos dramas do desemprego, a representação da resistência seja essencialmente a partir do foro individual e não através de instrumentos coletivos. Não é por acaso. A individualização das relações laborais e das sociedades traduziu-se num enfraquecimento brutal da parte com menos poder numa relação de trabalho: os /as trabalhadores/as assalariados/as. E a individualização da resistência parece ser o que percorre os imaginários coletivos. Isso só nos deve alertar. É mesmo preciso criar algo novo e agir de forma diferente. Que este magnífico filme nos ajude nessas tarefas. 

24 fevereiro 2015

O pecado de Juncker e o servilismo dos cães de fila


Estas últimas semanas confirmam que não estaremos longe da realidade se dissermos que os últimos sete anos ficarão profundamente inscritos na história social e política da europa. A forma como a crise financeira foi habilmente transformada pela elite europeia numa crise das dívidas soberanas, fez com que se operasse uma profunda mudança na relação de forças à escala europeia, que se traduziu num ataque sem precedentes a todos os direitos sociais, económicos, culturais e políticos conquistados principalmente no século XX. Estes sete anos representaram essa mudança de paradigma, em que austeridade se consubstanciou enquanto filosofia integradora da maior regressão civilizacional de que muitos e muitas teremos memória.

Mas se este processo de regressão civilizacional em curso teve consequências sociais brutais, a loucura europeia destes anos teve também consequências políticas arrasadoras. Os chamados partidos socialistas protagonizaram uma impressionante viragem à direita sendo protagonistas, aliados ou submissos de todas as políticas de austeridade destes anos. Voltámos a ter que lidar com a brutal ameaça das organizações fascistas e de extrema-direita. E assistimos agora a uma recomposição na esquerda com um conjunto de partidos com um programa anti-austeritário e de desobediência às instituições europeias que conseguem ser maioritários nos seus países.

Era impossível que os burocratas europeus assistissem sem reação a este furacão político. Depois do governo do Syriza na Grécia ter colocado pela primeira vez a hipótese de uma alternativa política de esquerda vencer na europa e depois do governo alemão ter assumido que é ele quem dirige a política europeia, Jean-Claude Juncker veio num tom surpreendente afirmar que “pecámos contra a dignidade dos povos, especialmente da Grécia, em Portugal e na Irlanda” referindo inclusive que “falta legitimidade democrática à troika”. De facto, só podemos valorizar a autocrítica de Juncker : “Eu era presidente do Eurogrupo e pareço estúpido em dizer isto, mas há que tirar lições da história e não repetir erros”.

Quais serão estas lições e qual a sua tradução política imediata? 

Inflectores: O futuro da Grécia no Prós e Contras


Aceder: Prós e Contras

Com a esclarecedora intervenção do Luís Bernardo (minuto 32).